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Áudio-descrição: Opinião, Crítica e Comentários - blog de Francisco Lima

Justificativa da proposição de disciplina de Áudio-descrição na formação para o professor que vai ensinar estudantes com deficiência visual: Virtualmente, todos os professores formados em pedagogia ou em licenciatura

por Francisco Lima

Justificativa da proposição de disciplina de Áudio-descrição na formação para o professor que vai ensinar estudantes com deficiência visual:
Virtualmente, todos os professores formados em pedagogia ou em licenciatura

Prezados,
Outro dia fui indagado a respeito de minha insistente luta pelo respeito ao que diz o artigo 53 do Decreto 5.296/04.
Expliquei que não era só por ele que eu lutava, mas pelo cumprimento dos quesitos de acessibilidade, de tecnologia assistiva devidos às pessoas com deficiência, porém vilipendiados cotidianamente, inclusive por setores públicos, negligenciados pelos que devem cumprir e fazer cumprir aquele Decreto e outros.
Expliquei, ainda, que a áudio-descrição, quando bem feita, mostra à pessoa cega, quanto esta não enxerga. E isso ficará patente, por exemplo, numa apresentação em um Congresso, em um discurso político etc.
Não só as palavras dizem coisas, como sabemos. os comportamentos verbais, de fato, dizem muito e aqueles que não enxergam fazem uso ótimo disso. mas tudo isso pode ser ainda melhor capturado, confirmado, corrigido, etc., quando se tem acesso ao comportamento visual, coisa que o bom tradutor visual, aquele que foi treinado a produzir áudio-descrições empoderativas vai trazer ao usuário.
Um leigo pode achar que a áudio-descrição em uma aula ou em uma apresentação oral não precisará de áudio-descrição.
Esse pensamento estreito e mal informado se assemelha ao de um indivíduo que acha que porque viveu na Espanha durante um ano, não terá benefícios de uma tradução simultânea profissional, feita em um evento na ONU, por exemplo.
O leigo que acha que uma aula apenas tem do professor a fala, não percebe que há uma enormidade de eventos visuais que fazem o social nessa aula, inclusive com o conteúdo visual ministrado pelo professor, pelo material apresentado por um outro aluno, e por aí vai.
Tomemos, de novo, uma palestra ou um discurso.
Um discurso presidencial, por exemplo :
A pessoa cega que acha que basta ouvir a fala da Presidenta, sem ter a áudio-descrição que lhe é de direito, pode perder a expressão que ela fez, por exemplo, quando alguém gritou da plateia que ela não deveria ter vetado dispositivos em favor da pessoa com deficiência, indo contra a Constituição a que jurou cumprir e defender.
Na fala dela, neste exemplo hipotético, é claro, nada ela deixou transparecer, fazendo-se de desentendida ou que apenas não ouviu a queixa da plateia.
No entanto, o tradutor visual mencionou o fato de a expressão da Presidenta ter ficado... desta ou daquela forma, dando ao usuário o empoderamento para que tire as conclusões a respeito da atitude da Presidenta: se ela entendeu ou não o que lhe foi dito.
Bem, o leigo, como eu disse, em nada alcança entender esses aspectos, mas, apesar dele, é mister que a áudio-descrição esteja na formação docente, seja quando o professor está em formação, na Universidade, seja posteriormente, em processo de formação continuada.
Quanto ao exemplo acima, bem, talvez seja por isso que certos operadores do Governo não querem a áudio-descrição simultânea: pensam que, sem ela, podem facilmente enganar as pessoas com deficiência visual.
Com efeito, certa vez me foi contado de um evento que certo indivíduo, lá envolvido com a política fazia uma fala perante umas 60 pessoas. Como não havia áudio-descrição, algumas pessoas faziam caras, riam e mesmo gesticulavam contra o que ele dizia. Certo momento, um, sorriu, fez um sinal para o público que faria uma pergunta e, tecendo elogios ao palestrante cego, indagou-lhe a respeito do assunto sobre o qual havia acabado de falar. Quando o tal palestrante, achando que estava “abafando”, fazendo sucesso com sua fala, recomeçou a expor suas argumentações, bem, o que perguntou voltou-se para a plateia, colocou as mãos sobre os ouvidos, riu e se sentou.
Várias pessoas acharam aquilo uma grosseria e até reprovou o ato, mais dizendo que “coitado dele, ele nem viu o que fulano fez”, do que achando que o que o palestrante falava era válido ou crível.
Os exemplos de onde cabe a áudio-descrição e de como a pessoa cega que pensa prescindir dela se engana são muitos, contudo, para este post fico com dar argumentos para que tenhamos a áudio-descrição na formação docente, como pode depreender do trecho que estratifico de outro documento que fiz e que agora trago para vocês.

“ O presente documento vem justificar a proposta da disciplina Áudio-descrição para o ensino de estudantes com deficiência visual, a ser ministrada no Curso de Graduação em Pedagogia, devendo esta disciplina estar aberta aos demais cursos de licenciatura.
Sustentamos a proposta com base no capítulo V da LDB, na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto Presidencial 6949/09, que tem status de Emenda Constitucional), na Lei 10098/00, no Decreto 5296/04, na Portaria MEC 3284/2003, Lei nº 13.006/2014 e na Nota Técnica MEC 385/2013:

II- ANÁLISE
II. 1 - OBRIGAÇÃO DAS IES E SEU ESCOPO
1. Assegurar a acessibilidade é uma obrigação das IES, públicas e privadas, pertencentes ao sistema federal de ensino . A obrigação é determinada, em especial, no Decreto n° 5.296/2004, bem como é definida pela Lei n° 10.048/2000, pela Lei n° 10.098/2000, pelo Decreto n° 5.626/2005 e pelo Decreto n° 7.611/2011, e regulamentada pela Portaria MEC n° 3.284/2003. Nesse mesmo sentido, preveem a política educacional vigente e os referenciais pedagógicos da educação inclusiva.
2. Para melhor compreensão dessa obrigação, destaca-se o previsto no art. 8o, inc.
I, do Decreto n° 5.296/2004:
Decreto n° 5.296/2004
Art. 8o Para os fins de acessibilidade, considera-se:
I - acessibilidade: condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida; (g.n.)
3. Logo, assegurar a acessibilidade é conferir condições necessárias para o pleno acesso, participação e aprendizagem dos estudantes com deficiência ou mobilidade reduzida, em todas as atividades acadêmicas.
4. Conforme explica o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP“, nessa perspectiva, acessibilidade pressupõe a eliminação de barreiras arquitetônicas e atitudinais, a promoção de tecnologia assistiva e atendimento educacional especializado para os alunos. O atendimento educacional especializado realiza-se mediante a atuação de profissionais com conhecimentos específicos no ensino da Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, da Língua Portuguesa como segunda língua na modalidade escrita, do sistema Braille, do Soroban, da orientação e mobilidade, das atividades de vida autônoma, da comunicação alternativa, do desenvolvimento dos processos mentais superiores, dos programas de enriquecimento curricular, da adequação e produção de materiais didáticos e pedagógicos, da utilização de recursos ópticos e não ópticos, da tecnologia assistiva, entre outros . (grifo nosso)

Como é sabido, o cumprimento ao que acima determinam o MEC e a Constituição, em particular, só será alcançado se os alunos de Pedagogia e Licenciatura Diversas forem minimamente capacitados, pelo menos conforme determinam a Lei de Diretrizes e Bases, e.g., artigo 59, e a Lei de Acessibilidade, e.g., artigo 17.
Considerando que a áudio-descrição é tecnologia assistiva imprescindível ao ensino de alunos com deficiência, considerando que ela está obrigada pelo Decreto 5296/04 a ser oferecida em Congressos, Conferências e aulas, e considerando que a Lei Brasileira da Inclusão, recentemente aprovada, reafirma a obrigatoriedade da oferta da áudio-descrição, a presente proposta da disciplina “Áudio-descrição para o ensino de estudantes com deficiência visual” vem, de fato, tardineiramente, e, até por isso, deve imediatamente fazer parte do rol de disciplinas que formam os futuros professores, pedagogos e demais licenciados.
Por tudo isso, e por não precisar explicar as razões pedagógicas para a oferta desta disciplina aos futuros professores que ensinarão alunos com deficiência, basta por resto justificar a presente proposta na necessidade de cumprir o “desenho universal”, devido também pela educação.”
Cordialmente,
Francisco Lima